Na noite da última segunda-feira, 10, o CineSesc abriu as portas para a apresentação do Filmelier+, novo streaming já disponível como canal dentro do Prime Video. Para embalar o evento, nada melhor do que um bom filme na tela do cinema: foi a oportunidade do público de São Paulo assistir ao documentário Quatro Paredes (Black Box Diaries), que estreou no streaming nesta terça-feira, 11, e que concorreu na categoria no Oscar 2025.
Após a sessão, um debate serviu para expandir as discussões ao redor do filme. Com presença da jornalista Flávia Guerra, da atriz Ana Hikari e da escritora Adriana Negreiros, o debate refletiu sobre a história da jornalista Shiori Itō, que transformou sua dor em uma investigação corajosa. Após sofrer uma agressão sexual, ela decide enfrentar o sistema judiciário japonês e expor as barreiras que silenciam tantas vítimas no Japão e no mundo.
Adriana Negreiros trouxe um relato muito íntimo, ressaltando como o filme ressoou com sua própria experiência – e como isso é importante. “Me identifico bastante com essa história. Sou jornalista e também passei por uma violência sexual. Durante anos, tratei esse trauma com distanciamento, como muitos jornalistas fazem, como se fosse apenas mais uma história. Mas o processo de Itō me tocou profundamente. A cena final, dela cantando no carro, é muito bonita. Mostra que a alegria pode continuar existindo, apesar de tudo”, diz.

Ana Hikari destacou a forma como o trauma não segue uma narrativa linear e como é forte ver isso na tela. “Lidar com um trauma é como um luto. Não há uma linha ascendente. É um movimento espiral, revemos a mesma dor de outra forma, em diferentes momentos. Ver o que essa mulher fez me deu vontade de ser ainda mais corajosa”, afirmou a atriz.
‘Quatro Paredes’: vergonha e silêncio
Um dos aspectos mais debatidos foi a cultura do silêncio, especialmente em países asiáticos, como destacou Ana. “Eu, como brasileira amarela, entendo esse peso”, explica. “Existe uma tradição de não falar sobre traumas e dores. Quatro Paredes é um filme essencial porque quebra esse ciclo. Eu mesma só consegui denunciar um caso que vivi por conta do apoio de outras mulheres e do meu pai. Sem isso, sozinha, eu não teria feito”.
Por outro lado, Adriana pontuou que nem todo silêncio pode ser rompido. “Passei quase 20 anos sem falar sobre o que vivi, e vi no documentário o peso que a exposição traz”, afirma a escritora. “Algumas mulheres não têm condições de quebrar o silêncio sem grandes perdas. Eu mesma só consegui escrever sobre meu caso depois que meu pai faleceu. Era algo que ele não conseguiria lidar. Precisamos entender que a história de uma mulher vítima de violência é também a história de uma família, de uma sociedade inteira”.
E atenção: nesta quarta-feira, 12 de março, o Filmelier+ terá outra sessão especial no CineSesc, com a apresentação de Sem Chão, às 20h.