Há rostos que se tornam tão familiares na cultura pop que parecem fazer parte da nossa própria história. Catherine O’Hara é um desses tesouros, uma artista cujo brilho só aumenta com o tempo. Depois de décadas fazendo o público gargalhar com personagens inesquecíveis em Beetlejuice e Schitt’s Creek, a atriz canadense ressurge em 2025 em dois universos completamente distintos: a brutalidade pós-apocalíptica de The Last of Us da HBO e os bastidores caóticos de Hollywood em O Estúdio, nova sátira da Apple TV+ criada por Seth Rogen.
Tudo sobre Catherine O’Hara
Catherine O’Hara: da improvisação às telas globais
Toronto, 1954. Catherine Anne O’Hara dá seus primeiros passos no improviso teatral na Second City, berço criativo que moldou gerações de comediantes norte-americanos. Foi nesse caldeirão de talentos que estabeleceu amizades e parcerias artísticas duradouras com Eugene Levy e Martin Short, antes de conquistar seu espaço no programa SCTV — rival canadense do Saturday Night Live que se tornaria referência no humor televisivo.
O que poucos sabiam naquele momento é que o rosto daquela jovem comediante se tornaria um dos mais queridos da cultura pop. Com uma habilidade natural para equilibrar o absurdo e o genuíno, O’Hara não demorou a chegar ao cinema, eternizando-se como a mãe atrapalhada de Macaulay Culkin em Esqueceram de Mim — papel que, ironicamente, quase recusou.
Mas um de seus papéis mais memoráveis no cinema veio com Os Fantasmas se Divertem (Beetlejuice, 1988), dirigido por Tim Burton. Na pele da excêntrica e performática Delia Deetz, O’Hara entregou uma atuação que se tornou cultuada, misturando humor ácido, expressividade exagerada e uma aura artística fora do comum.
A cena em que sua personagem é possuída durante um jantar e começa a cantar Day-O (The Banana Boat Song) é um clássico absoluto da comédia dos anos 80, e um exemplo perfeito de como a atriz domina o timing cômico mesmo em contextos absurdos. O filme marcou o início de uma longa colaboração com Burton, com quem voltaria a trabalhar em animações como O Estranho Mundo de Jack e Frankenweenie, além da continuação Os Fantasmas Ainda Se Divertem: Beetlejuice Beetlejuice, consolidando sua presença no cinema de gênero e fantasia com um toque autoral.
Carreira no humor
Mas foi nas colaborações com Christopher Guest que Catherine encontrou sua verdadeira zona de excelência. Em mocumentários como O Melhor do Show e A Mighty Wind, suas interpretações semi-improvisadas revelaram uma atriz de habilidades raras, capaz de transitar entre o hilário e o comovente em questão de segundos.
Esses filmes, estruturados a partir de diretrizes gerais que permitiam aos atores improvisar diálogos e construir personagens, transformaram O’Hara em uma figura reverenciada entre comediantes. Sua abordagem nunca buscava a risada fácil ou o escárnio gratuito, mas sim uma observação precisa e afetuosa das excentricidades humanas.
Fenômenos e novas oportunidades na TV
Quando a maior parte dos atores já considera reduzir o ritmo de trabalho, Catherine O’Hara atingiu o auge de sua popularidade. Em Schitt’s Creek, sua Moira Rose — ex-estrela de novelas com sotaque indefinível, guarda-roupa extravagante e uma coleção impressionante de perucas — tornou-se um fenômeno cultural instantâneo.
O papel, que lhe rendeu um Emmy em 2020, não apenas cativou uma nova geração de fãs, mas consolidou seu lugar no panteão da comédia. Cada “bebê” pronunciado naquele sotaque bizarro, cada peruca batizada carinhosamente, cada outfit surreal compõe agora o mosaico de uma das personagens mais originais da TV contemporânea.
Quando a HBO anunciou sua participação na segunda temporada de The Last of Us, muitos ficaram surpresos. Conhecida primordialmente por papéis cômicos, O’Hara assume agora um personagem misterioso que cruza o caminho de Ellie (Bella Ramsey) em um dos episódios mais íntimos da nova temporada. É um desafio que abraça com a mesma dedicação de sempre, provando que sua capacidade interpretativa vai muito além da comédia.
Simultaneamente, em O Estúdio, ela retorna às suas origens humorísticas como uma veterana executiva de Hollywood lutando para manter sua relevância em um ambiente cada vez mais jovem e tecnológico após ser demitida. A série aproveita sua habilidade natural para satirizar o universo do entretenimento, algo que conhece profundamente após quase cinco décadas de carreira.
Uma carreira singular
O que torna Catherine O’Hara tão especial? Talvez seja sua recusa em seguir fórmulas. Ao longo de décadas, ela escolheu projetos que lhe dessem espaço para experimentação, frequentemente contribuindo na própria construção de suas personagens. Seus trejeitos peculiares, sotaques inventados e timing cômico perfeito são resultados dessa liberdade criativa que sempre buscou.
Mesmo em papéis menores, sua presença magnética rouba a cena. Assim, é como se cada personagem fosse uma extensão sincera de sua própria curiosidade sobre o comportamento humano. É um estudo afetivo dos nossos maneirismos, vaidades e inseguranças.
Aos 70 anos, quando muitos atores já penduraram os figurinos, Catherine O’Hara expande seu repertório e continua surpreendendo. Sua trajetória é um testemunho de como o talento pode construir uma carreira não apenas longa, mas cada vez mais relevante.
De comediante de esquetes a atriz dramática premiada, de ícone da TV a referência para novas gerações de artistas, Catherine O’Hara segue desafiando expectativas. E nós, o público, somos os maiores beneficiados dessa incansável busca pela verdade cômica e dramática que define sua arte singular.
