Na tela de Coração de Lutador: The Smashing Machine, estreia desta quinta, 2, Mark Kerr (Dwayne Johnson) parece um tanque de guerra humano. Ele é enorme, tem músculos definidos em todo o corpo e é conhecido por nunca perder nas lutas de UFC, campeonato que está dando seus primeiros passos nos anos 1990. No entanto, o retrato de Kerr no filme passa longe de um Rocky Balboa — o lutador é, na verdade, um homem sentimental.
Esse parece ser o foco do cineasta e roteirista Benny Safdie, cineasta que fez uma carreira de destaque com o irmão em filmes como Joias Brutas. Agora, anda com as próprias pernas em um filme que tem algo a dizer para além de ser uma cinebiografia. Obviamente, vários aspectos da vida de Kerr estão retratados ali: o vício em opioides, a relação bastante complicada com a esposa (vivida por uma brilhante Emily Blunt), as amizades nos ringues.

No entanto, tudo isso serve apenas como trampolim para que Kerr seja revelado como um homem que chora. Um homem que tem medo. Ele se recusa a ir num brinquedo de parque de diversões por ter o estômago frágil; diz para um garotinho qualquer que não deve ser violento; quando diz para um amigo que quer sair pra se divertir, vai pra porta do hotel em que está no Japão para dar autógrafos — não vai para um bar, para a farra ou algo assim.
The Smashing Machine: complexidade (e fragilidade) masculina
É justamente essa complexidade visual e narrativa que Safdie parece buscar à qualquer custo. Obviamente, ainda há algo de violento em Kerr. É impossível fugir disso, ainda mais sendo um homem que ganha dinheiro com socos, pontapés e nocautes. Em um dos momentos do filme, por exemplo, ele destrói uma porta, arrancando-a pela metade. Mas é um momento isolado dentro dessa proposta de tornar complexa uma “pessoa de músculos”. No fim, um homem bruto que chora é a imagem mais potente The Smashing Machine.
Para essa proposta funcionar, e realmente funciona, duas pessoas são essenciais nesse processo: Safdie e The Rock. O primeiro se mostra como um diretor realmente competente, mesmo sem o irmão ao lado. Seu estilo de filmagem ajuda Coração de Lutador: The Smashing Machine a se afastar da narrativa óbvia de cinebiografia. Se afasta de momentos exagerados de glória e se aproximando do desespero e fragilidade humanas. O filme tem mais cenas de Kerr se recuperando de algo do que realmente na pancadaria.
É como se fosse um filme com quebra de expectativa (ainda que as cenas de luta estejam ali). Oras, o foco não é a carreira de Kerr — que pode até ser considerada um tanto fracassada. Mas sim sua humanidade e sua pessoa. Um brutamontes pode ter coração.
O grande filme de Dwayne Johnson
Já Dwayne Johnson é a grande surpresa da equação e essencial no processo de humanização de Kerr. De um lado, ele empresta toda sua fisicalidade para o personagem — é naturalmente ameaçador, bruto. No entanto, a atuação do ex-lutador suaviza esses traços com um homem que não está sabendo lidar com tudo ao seu redor. Ao mesmo tempo que é ameaçador naturalmente, The Rock também é sentido como alguém muito ameaçado pelo ambiente que o sufoca em vários momentos. Algo típico de uma grande atuação.
Com isso, Coração de Lutador: The Smashing Machine entra de cabeça na temporada de premiações. Tudo bem que algumas coisas poderiam ser mais claras e azeitadas. É o caso da questão envolvendo a masculinidade tóxica e a masculinidade forçada, mas as boas ideias estão ali, espelhadas numa direção que sabe causar estranhamento na forma e no conteúdo. Prova de que é pra continuar de olho nos Safdie, juntos ou separados.