Uma Batalha Após a Outra chega aos cinemas nesta quinta, 25, e é natural que surja a vontade de colocar ordem na cinematografia do diretor, Paul Thomas Anderson. Sobre o que ele gosta de falar? Qual tema lhe é caro? Afinal, numa olhada rápida, o americano já falou sobre cultos, indústria pornográfica, romances adolescentes e até sobre a nascente indústria do petróleo. Mas isso é só a superfície: Paul Thomas Anderson está sempre de olho na sociedade e, sobretudo, como o passado molda (e draga) as pessoas e suas vidas.

Neste filme, esse olhar não muda. Anderson começa falando sobre uma guerrilha que luta para libertar imigrantes presos injustamente nos Estados Unidos. Perfídia (Teyana Taylor) é a durona da equação numa gangue cheia de personalidade. Enquanto isso, o novato especialista em demolições “Ghetto Pat” (Leonardo DiCaprio) tenta provar seu valor. É daí que nasce um relacionamento e, depois, uma filha excessivamente protegida pelo pai.
Uma Batalha Após a Outra: um filme de personagens imperfeitos
O vilão desse herói imperfeito que é “Ghetto Pat” — ou apenas Bob, como é chamado depois — é o bizarro Coronel Steven J. Lockjaw (Sean Penn). É um militar estranho, durão e com alguns fetiches inesperados, que fica perdidamente encantado por Perfídia, apesar da missão de detê-la em suas missões. Esse relacionamento complicado deságua numa clara obsessão, com esses personagens correndo um atrás do outro de maneira inevitável.
“Não penso em fazer um filme que dialogue diretamente com outro. Mas inevitavelmente você carrega tudo que viu e amou. É como um eco que aparece nas imagens, às vezes sem perceber”, disse o cineasta, durante coletiva de imprensa com a presença do Filmelier.
E é justamente essa a sensação que surge em Uma Batalha Após a Outra. PTA busca, de qualquer forma, entender a sociedade e o passado. O foco é entender ideologia, política e a sensação de impotência e como isso se transforma com o passar do tempo, refletindo inclusive a partir dos relacionamentos familiares. Difícil não invocar o cantor e compositor brasileiro Belchior (“Minha dor é perceber / Que apesar de termos feitos / Tudo, tudo, tudo, tudo que fizemos / Ainda somos os mesmos / E vivemos / Ainda somos os mesmos / E vivemos / Como os nossos pais”). Tudo continua igual e PTA não sabe lidar com isso.
Afinal, ali pela metade do filme, Uma Batalha Após a Outra tem um salto temporal considerável. Tudo muda na vida de Bob/Ghetto Pat. A esposa sumiu, criou sozinho a filha e precisa se esconder de Lockjaw. Mas, de maneira bastante clara, é interessante perceber como pouco ao redor se transformou. Os cenários parecem os mesmos e são poucas as novas facilidades do dia a dia — os celulares quase não aparecem, assim como quaisquer outras tecnologias. O mundo é árido e as ideias retrógradas continuam as mesmas.
Um mundo andando em círculos
Será que a luta de Bob e Perfídia foi em vão? Será que a sociedade perdeu? Paul Thomas Anderson não estará interessado em respostas, mas apenas em colocar sentimentos na tela sobre como isso se comporta (e como irá se comportar no futuro). A ideologia some, se transforma? Tem como dar continuidade? Há continuidade numa luta social como essa?
É interessante a sensação de que a história não para de acontecer, com tudo rolando a todo momento, mas ao mesmo tempo com tudo parado, no ar. As coisas avançam em Uma Batalha Após a Outra, mas ao mesmo tempo ficam paradas — e não é como se andasse pra trás, mas sim como se tudo estivesse estagnado. Também vale tentar encaixar o filme em um quadrado, em uma gaveta — é drama, é thriller, é ação pura e simples? É tudo e nada.
É preciso também dar destaque para o elenco. DiCaprio está em seu melhor papel desde O Lobo de Wall Street. Deliciosamente exagerado, estranho, engraçado de um jeito quase desconfortável. “O que me atraiu [no papel] foi a humanidade do personagem. Ele parece um herói clássico, mas na verdade é falho, não consegue lembrar nem uma senha. Sua verdadeira força está em proteger a filha”, disse, na coletiva. “O Grande Lebowski foi uma influência. Também Um Dia de Cão, com o fanatismo do Pacino para salvar quem ama”.
Sean Penn, o destaque de Uma Batalha Após a Outra

Mas o destaque absoluto é Sean Penn — que, cá entre nós, já deve estar com o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante nas mãos. Ele ajuda a acompanhar o tom bizarro da coisa toda, quase como se fosse um homem obcecado sem entender exatamente como ou pelo que.
“[PTA] não pede que você construa algo artificial. Ele pede que você encontre o ritmo que já está no papel e depois ajusta a energia. Mais intensidade aqui, mais calma ali”, conta o ator. “Havia uma urgência em cada cena. Não era só sobre o que o personagem dizia, mas como se movia, como ocupava o espaço. Eu tinha que manter essa pulsação constante”.
Assim, Uma Batalha Após a Outra é tudo isso que se esperava de um cineasta como Paul Thomas Anderson: um filmaço, um olhar desesperado para a complexidade do hoje, um grito de medo com uma risada no final. É o exemplo de um filme completo e que sabe como abordar o caos do mundo. Seja de ontem, hoje e amanhã. É PTA como todo mundo queria.