Acidentes em sets de filmagem são raros, mas reais — e quase sempre evitáveis. Eles ocorrem quando falhas de protocolo, pressões de cronograma ou decisões negligentes colocam a segurança em segundo plano. A seguir, relembramos casos emblemáticos, do recente Rust: A Lei do Oeste, a outros episódios que provocaram mudanças de segurança na indústria.
Rust (2021–2024): tiro no ensaio, uma vida perdida e julgamentos

Em 21 de outubro de 2021, durante um ensaio no set do faroeste Rust: A Lei do Oeste, no Novo México, o ator Alec Baldwin disparou acidentalmente uma arma que continha munição real. O tiro matou a diretora de fotografia Halyna Hutchins e feriu o diretor Joel Souza.
A investigação apontou falhas em série. O primeiro assistente de direção, David Halls, admitiu não ter checado a arma corretamente e firmou um acordo judicial em 2023. A armeira Hannah Gutierrez-Reed foi condenada por homicídio culposo e recebeu a pena máxima de 18 meses de prisão. Já Baldwin teve o julgamento encerrado em 2024 após a juíza considerar que promotores violaram regras na entrega de provas. Em 2025, um processo separado movido pelo ator contra os promotores também foi arquivado.
O caso segue como marco trágico de como negligências básicas no manuseio de armas cenográficas podem ter consequências fatais.
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Brandon Lee em O Corvo (1993): peça esquecida e o disparo que não deveria existir

Talvez o caso mais conhecido seja o de O Corvo (1994). Durante a gravação de uma cena com revólveres que usavam dummy rounds (cartuchos cenográficos sem pólvora), um fragmento de projétil ficou preso no cano após uma tomada anterior. Mais tarde, ao se disparar um blank (carga de pólvora sem projétil, conhecida no Brasil como bala de festim), a pressão fez com que o fragmento fosse expelido como uma bala real. Brandon Lee, filho de Bruce Lee, foi atingido no abdômen e morreu horas depois.
As gravações foram suspensas por algumas semanas. O estúdio decidiu concluir o filme com uso de dublês, reescrita de cenas e efeitos visuais, preservando as imagens que Brandon já havia gravado. O Corvo foi dedicado à memória do ator e se tornou cultuado — tanto pelo estilo sombrio quanto pela tragédia que marcou sua produção.
Uma nova versão estreou 30 anos depois, estrelando dessa vez, Bill Skarsgård.
Twilight Zone: The Movie (1982): helicóptero, pirotecnia e três mortes

Durante as filmagens de um dos segmentos de Twilight Zone: The Movie (1983), um helicóptero perdeu controle após cruzar com explosões cenográficas. A aeronave caiu sobre o ator Vic Morrow e duas crianças contratadas para a cena, Myca Dinh Le e Renee Shin-Yi Chen. Os três morreram no local.
O diretor John Landis e outros membros da equipe foram processados, mas acabaram absolvidos. Ainda assim, o acidente gerou mudanças profundas na indústria. A principal delas foi a revisão das regras para o trabalho de menores em sets: passaram a ser exigidas autorizações formais, limite de horários, acompanhamento de responsáveis legais e restrição total de crianças em cenas com efeitos especiais, armas ou veículos.
A tragédia também expôs os riscos da combinação entre pressa, orçamento apertado e ambição visual — um alerta que reverbera até hoje.
Sarah Jones em Midnight Rider (2014): trilho liberado sem autorização
A assistente de câmera Sarah Jones, 27 anos, morreu ao ser atingida por um trem durante gravação em uma ponte ferroviária para Midnight Rider. A produção não tinha autorização para estar naquela linha; uma maca cenográfica foi colocada nos trilhos. O diretor Randall Miller se declarou culpado por homicídio culposo em 2015. A empresa Film Allman foi autuada por violações graves de segurança pelo órgão trabalhista dos EUA. O caso virou símbolo de mobilização por condições seguras em set.
Depois do acidente, estúdios reforçaram auditorias internas para checar licenças de locação. Plataformas como a Safety for Sarah surgiram, pressionando por ambientes de trabalho onde ninguém possa ser exposto a riscos sem autorização legal. Desde então, equipes costumam exigir contratos e laudos escritos antes de pisar em trilhos, pontes ou áreas públicas sensíveis.

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Joi “SJ” Harris em Deadpool 2 (2017): dublê de moto

A piloto profissional de motovelocidade Joi “SJ” Harris morreu durante as filmagens de Deadpool 2 (2018), enquanto dublava a personagem Domino. Foi sua primeira atuação como dublê. Durante uma sequência de moto, Harris perdeu o controle e colidiu com a fachada de um prédio. O laudo apontou trauma contundente. Ela não usava capacete — seguindo a caracterização da personagem, que também aparecia sem o acessório.
O acidente, trouxe mais uma vez, discussões sobre protocolos de segurança para dublês, especialmente em cenas com veículos. Desde então, tornou-se comum o uso de capacetes camuflados digitalmente na pós-produção, além da exigência de profissionais com experiência específica em cinema, mesmo quando já possuem carreira em esportes de alto risco.
Outros casos de acidentes
Além dos casos mais conhecidos, outros acidentes fatais em sets também mudaram protocolos e deixaram lições amargas para a indústria.
Kun Liu em Os Mercenários 2 (2011)
Durante a gravação de uma cena de ação, de Os Mercenários 2, em um barco na Bulgária, uma explosão saiu do controle. O dublê chinês Kun Liu morreu no local, e outro profissional ficou gravemente ferido. O acidente expôs os riscos de sequências com múltiplos efeitos práticos em ambientes instáveis. Desde então os sets que envolvem água e pirotecnia passaram a exigir planos de evacuação melhores.
John Bernecker em The Walking Dead (2017)
Em julho de 2017, o dublê John Bernecker caiu de cerca de oito metros em um set na Geórgia. Ele não atingiu o colchão de segurança como planejado e morreu em consequência dos ferimentos. O episódio levou a uma pausa imediata na produção e reacendeu a discussão sobre margens de segurança em quedas controladas. Hoje, cenas semelhantes precisam de redundâncias — não apenas um, mas dois ou mais sistemas de proteção.
Paul Mantz em O Voo da Fênix (1965)
Veterano de Hollywood e piloto renomado, Paul Mantz morreu quando o avião improvisado construído para o filme quebrou ao meio durante uma cena de pouso em área desértica. O acidente aconteceu em pleno set da versão original de O Voo da Fênix. Sua morte levou a regulamentos mais rigorosos para voos em filmagens, obrigando a presença de supervisores da aviação civil em qualquer cena aérea.
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Como esses casos mudaram práticas de set
Esses acidentes revelaram falhas técnicas, negligência e pressões por economia e agilidade. Rust expôs os riscos de banalizar cuidados com armas cenográficas. O Corvo mostrou como um detalhe ignorado em uma única noite pode ser fatal. Twilight Zone deixou marcas profundas ao envolver crianças em condições perigosas. Midnight Rider virou caso emblemático de filmagens feitas sem autorização. Deadpool 2 ampliou globalmente o debate sobre segurança de dublês.
Tragédias como essas resultaram em normas que hoje evitam novas perdas — ainda que, em alguns sets, insistam em ignorá-las.
Não há atalho que substitua checagem, preparação e a autoridade de quem responde por segurança.
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