O que realmente determina a atração entre duas pessoas? Kogonada, o aclamado cineasta por trás de Columbus e A Vida Depois de Yang, busca respostas para essa questão em A Grande Viagem da Sua Vida, que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 17. Mais do que um romance tradicional, o filme funciona como um mergulho na psiquê de seus personagens.
A premissa é aparentemente simples: David (Colin Farrell) conhece Sarah (Margot Robbie) em um casamento e instantaneamente se conectam. Ela é espontânea, dança sem pudor e até propõe casamento a esse desconhecido. Ele fica encantado por essa liberdade. Mas Kogonada, trabalhando com o roteirista Seth Reiss, usa esse encontro como ponto de partida para uma investigação muito mais complexa.
A Grande Viagem da Sua Vida: Uma viagem pela psique
O verdadeiro protagonista do filme não é o casal, mas sim o processo terapêutico que eles vivenciam. Guiados por uma voz misteriosa de GPS – que funciona como metáfora para a orientação psicológica -, David e Sarah embarcam em uma viagem literal e figurativa através de suas memórias e traumas.
David carrega cicatrizes de rejeições amorosas, incluindo uma humilhação escolar que ainda ecoa em sua vida adulta. Sarah, por sua vez, construiu muros emocionais após enfrentar a perda da mãe ainda jovem, preferindo relacionamentos superficiais a vínculos profundos. O filme revela como essas experiências formativas continuam influenciando suas escolhas românticas.
Kogonada demonstra familiaridade impressionante com conceitos da psicologia clínica, especialmente a terapia cognitivo-comportamental e o psicodrama. O diretor usa a exposição gradual aos traumas como estrutura narrativa, permitindo que os personagens – e o público – processem essas experiências de forma controlada e reflexiva.
Particularmente eficaz é como o filme incorpora elementos do psicodrama, com os protagonistas literalmente encenando situações do passado. Uma sequência em um teatro, onde aparecem com roupas cotidianas representando memórias dolorosas, exemplifica essa abordagem inovadora.
Cinema inteligente, mesmo com limitações
A abordagem de Kogonada resulta em um filme que desafia as convenções do gênero romântico. Em vez de focar apenas na química entre os protagonistas, A Grande Viagem da Sua Vida questiona como nos tornamos quem somos e como isso impacta nossa capacidade de nos relacionarmos.
Colin Farrell e Margot Robbie entregam performances nuançadas. Navegam com habilidade entre a leveza romântica e a profundidade psicológica exigida pelo roteiro. Ambos conseguem transmitir tanto a vulnerabilidade quanto a resistência de personagens que lutam contra seus próprios mecanismos de defesa.
O filme, contudo, não está livre de excessos. Kogonada ocasionalmente se repete, revisitando temas já explorados quando poderia avançar na narrativa. Alguns momentos finais parecem esticar conceitos já bem estabelecidos, sugerindo que o diretor poderia ter encontrado um equilíbrio mais eficaz entre profundidade e economia narrativa.
Natureza humana
A Grande Viagem da Sua Vida confirma Kogonada como um dos cineastas mais interessantes da atualidade. Sua recusa em aceitar fórmulas prontas e sua busca constante por camadas de significado fazem dele um diretor singular. Aqui, ele usa o romance como veículo para explorar questões fundamentais sobre identidade, trauma e cura.
O resultado é um filme que funciona simultaneamente como entretenimento e reflexão. Afinal, oferece uma perspectiva madura sobre como nossas experiências passadas continuam moldando o presente. Para quem busca cinema que vá além do superficial, A Grande Viagem da Sua Vida oferece uma jornada recompensadora através da complexidade das relações humanas.
