As comédias românticas foi a primeira experiência com o amor romântico. Fosse na sala escura ou diante da TV em tardes de sessão dublada. Os galãs que sustentavam essas histórias eram rostos bonitos, carregavam charme, timing cômico e uma fragilidade que arrancava suspiros. Hugh Grant, Richard Gere, Pierce Brosnan e tantos outros se tornaram sinônimo de paredes cheias de pôsteres.
A indústria do Chick Flick
Chick flicks eram produções de médio orçamento, feitas com atores reconhecíveis s e com trilhas sonoras chiclete. Ao contrário de hoje, quando o gênero aparece mais em plataformas digitais, naquelas décadas essas histórias eram eventos. O público ia ao cinema para rir, suspirar e sair cantarolando a música-tema.
Nessa engrenagem, surgiram atores que se tornaram rostos inseparáveis do gênero. Eles não eram super-heróis, nem brutamontes. Representavam algo mais cotidiano: homens atrapalhados, confiáveis, charmosos de um jeito nada musculoso. Na época, foram apresentados como conquistas amorosas ideais. Hoje, atravessando os sessenta ou setenta anos, assumem outros papéis: vilões divertidos, pais melancólicos, mentores cansados.
Hugh Grant: o britânico das gagues

O início do fenômeno
Entre os galãs da década de 90, Hugh Grant é talvez o rosto mais lembrado em comédias românticas. Sua projeção internacional começou com Quatro Casamentos e um Funeral (1994). Dirigido por Mike Newell e escrito por Richard Curtis. O filme custou cerca de US$ 4,4 milhões e arrecadou mais de US$ 240 milhões, surpreendendo até a própria produção. A performance de Grant lhe rendeu o Globo de Ouro de Melhor Ator em Comédia ou Musical. Além de críticas positivas que destacavam seu jeito atrapalhado, os silêncios desconfortáveis e a capacidade de tornar falhas em algo charmoso.
Com esse sucesso, Grant virou aposta certa. Um Lugar Chamado Notting Hill (1999), ao lado de Julia Roberts, consolidou essa imagem. A história de um livreiro anônimo que se envolve com uma estrela de cinema se transformou em um dos filmes mais lucrativos da época, superando US$ 360 milhões em bilheteria.
O efeito Grant
Grant passou a simbolizar o que a indústria vendia como o “inglês atrapalhado”. Essa imagem não se restringia ao cinema: trailers, cartazes e campanhas publicitárias exploravam esse estereótipo. Nos Estados Unidos, ele era divulgado como selo de “comédia britânica” confiável, enquanto no Reino Unido se tornava um cartão de visita cultural exportado para Hollywood.
O personagem Daniel Cleaver, em O Diário de Bridget Jones (2001), expandiu esse repertório. Grant interpretou um editor mulherengo, divertido e cruel, antagonista perfeito para o romântico vivido por Colin Firth.
A mudança de rota
Ao perceber que o arquétipo começava a cansar, Grant buscou outra direção. Na década de 2010, abraçou papéis mais arriscados. Em Paddington 2 (2017), ironizou a si mesmo ao interpretar um ator decadente e vaidoso. Em Magnatas do Crime (2019), de Guy Ritchie, surgiu como golpista extravagante, arrancando elogios da crítica pela ousadia e pelo tom debochado. Mais recentemente, apareceu em Glass Onion: Um Mistério Knives Out (2022) em uma ponta comentada, além de Dungeons & Dragons: Honra Entre Rebeldes (2023), onde deu vida a um trapaceiro oportunista.
A crítica internacional destacou sua habilidade em transformar em comédia os mesmos trejeitos que antes o tornavam o romântico atrapalhado.
Richard Gere: o executivo elegante que virou ator de prestígio
O marco inicial
Se Hugh Grant representava o britânico hesitante, Richard Gere encarnava outro perfil: o homem maduro e seguro de si. Gere já tinha carreira sólida antes dos anos 90, mas foi com Uma Linda Mulher (1990) que consolidou sua imagem como um homem elegante, calmo e sedutor. Ao lado de Julia Roberts, interpretou Edward Lewis, empresário que contrata uma acompanhante e acaba se apaixonando. O longa arrecadou mais de US$ 460 milhões e entrou para o rol das comédias românticas mais conhecidas do cinema. Roberts recebeu indicação ao Oscar, mas a crítica também reconheceu Gere: sua postura e seu modo de entregar afeto em pequenas doses ajudaram a trama.
A volta com Julia Roberts
A química da dupla foi retomada em Noiva em Fuga (1999). Roberts interpretava Maggie, mulher que abandonava noivos no altar, enquanto Gere surgia como jornalista investigativo disposto a entender sua fama.
Mudanças no percurso
Nos anos 2000, Gere começou a escolher papéis que exigiam mais dramaticidade. Em Chicago (2002), musical premiado com o Oscar de Melhor Filme, encarnou Billy Flynn, advogado carismático que manipula imprensa e júri. Sua performance lhe rendeu indicação ao Globo de Ouro. A crítica destacou como o ator soube usar o mesmo charme dos romances, mas em registro mais cínico.
Depois vieram títulos como Bee Season (2005), onde interpretava um professor obcecado pelo talento da filha, e Amelia (2009), vivendo o marido da aviadora Amelia Earhart. Em Arbitrage (2012), foi elogiado pela interpretação de um magnata das finanças em colapso, papel que muitos consideraram um dos melhores da fase madura de sua carreira.
Trabalhos recentes
Norman: Confie em Mim
Em 2016, estrelou Norman: Confie em Mim, dirigido por Joseph Cedar. No papel-título, ele vive Norman Oppenheimer, um operador político nova-iorquino que sobrevive de contatos frágeis, favores e promessas que nunca parecem se concretizar.
O filme, exibido em festivais como Telluride e Toronto, foi apontado como uma das melhores atuações da carreira de Gere. Críticos ressaltaram como ele conseguiu transformar uma figura patética em alguém ao mesmo tempo cômico e melancólico. Norman é um homem que não pertence a lugar algum, mas acredita que pode entrar em qualquer sala apenas com conversa e insistência.
A atuação de Gere recebeu elogios pela maneira como evitou caricatura. Em vez de transformar Norman em piada fácil, ele trouxe humanidade a um sujeito que, mesmo enganando os outros, engana a si próprio em proporções ainda maiores. O New York Times descreveu o desempenho como um “retrabalho de imagem”, capaz de mostrar o ator fora do glamour, abraçando um homem pequeno, solitário e perdido em busca de relevância. Você pode assistir Norman Oppenheimer de graça no Adrenalina Freezone.
Oh, Canadá!
Richard Gere voltou aos holofotes em Cannes de 2024 com Oh, Canadá, dirigido por Paul Schrader e inspirado no romance Foregone, de Russell Banks. A escolha do diretor em colocar Gere no papel principal chamou atenção porque resgata uma colaboração que vinha sendo esperada por cinéfilos há anos.
No longa, Gere interpreta um documentarista canadense em fim de vida, que decide abrir passagens de seu passado diante de um ex-aluno que o entrevista. A narrativa alterna lembranças, invenções e arrependimentos, questionando até onde a memória pode ser confiável. Schrader constrói o filme em um tom intimista, com diálogos longos e silêncios carregados, onde cada pausa tem peso equivalente a um discurso.
Para os críticos que acompanharam o festival, Oh Canada representou uma espécie de consagração tardia: a prova de que Gere continua disposto a assumir riscos artísticos em vez de buscar apenas projetos comerciais. O IndieWire apontou o filme como “um dos mais densos da carreira recente de Schrader”, destacando a entrega de Gere como peça central dessa densidade.
Além da tela
Fora do cinema, Gere se tornou conhecido por seu engajamento político e espiritual. É praticante do budismo tibetano, ligado ao Dalai Lama, e defensor de causas humanitárias. Essa postura também influenciou suas escolhas artísticas, aproximando-o de cineastas interessados em dilemas éticos e sociais.
Impacto cultural
Nos anos 90, Gere representava segurança e maturidade em um gênero muitas vezes marcado por protagonistas jovens. Essa diferença o colocou em posição singular: não era o atrapalhado britânico nem o conquistador fanfarrão. Era o homem que aprendia a amar com calma, mesmo cercado por contratos e negócios.
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Brosnan, Pierce
A fase Bond e o reflexo no romance
Pierce Brosnan ganhou projeção internacional ao assumir James Bond em 007 Contra GoldenEye (1995), após um hiato de seis anos da franquia. Sua estreia arrecadou mais de US$ 350 milhões e reposicionou o espião no cenário pop.
Embora Bond fosse o emblema da ação, a sofisticação que exibia nos ternos bem cortados e nos gestos calculados se ajustava a tramas de amor. Hollywood percebeu isso, e logo Brosnan se tornou alternativa para personagens que exigiam sedução, mistério e uma pitada de humor.
O Caso Thomas Crown
Em Thomas Crown – A Arte do Crime (1999), remake do clássico de 1968, Brosnan interpretou um milionário refinado envolvido em um jogo de atração e espionagem com a investigadora vivida por Rene Russo. A química entre os dois foi destacada pela crítica, que elogiou o equilíbrio entre suspense e romance. O filme rendeu mais de US$ 120 milhões.
O inesperado em Mamma Mia!

Em 2008, surpreendeu ao participar da adaptação do musical Mamma Mia!, com canções do ABBA. No papel de Sam Carmichael, um dos possíveis pais da protagonista, dividiu cenas com Meryl Streep em números musicais que, mesmo com limitações vocais, conquistaram o público. O filme arrecadou mais de US$ 600 milhões e apresentou Brosnan a uma geração que não o conhecia como Bond. Dez anos depois, repetiu o papel em Mamma Mia! Lá Vamos Nós de Novo (2018), reforçando a disposição de abraçar projetos fora da zona previsível.
Outros caminhos
Ao deixar a franquia 007 com Um Novo Dia para Morrer (2002), Brosnan buscou diversidade. Em O Matador (2005), interpretou um assassino de aluguel excêntrico, recebendo elogios pelo tom mais ácido. Em O Escritor Fantasma (2010), dirigido por Roman Polanski, viveu um ex-primeiro-ministro britânico envolvido em escândalos, ampliando sua presença em thrillers políticos.
Essas escolhas mostraram que não se limitava ao perfil de sedutor: podia ser cínico, trágico, vilão ou figura de comédia. A crítica destacou essa versatilidade como traço marcante de sua filmografia.
Charlie em Ação
Entre os títulos recentes de Pierce Brosnan, Charlie em Ação merece atenção especial. Brosnan interpreta um matador, chamado para eliminar um alvo, mas que se vê envolvido em disputas maiores do que o esperado.
O filme ganhou elogios por resgatar o clima dos thrillers dos anos 70. A crítica ressaltou a fotografia, o ritmo objetivo e o tom de despedida que paira sobre o personagem central. Para muitos, foi um dos melhores trabalhos do ator, justamente porque oferece um cinema de gênero com raízes clássicas.
Disponível no Adrenalina Pura+, Charlie em Ação traz Pierce Brosnan em um papel de violência pura. A trama avança sem descanso, com cenas de perseguição e confronto que não aliviam para o espectador. É um cinema de ação que vai direto ao ponto: disparos, tensão e explosões.
O lado romântico
Mesmo identificado com espionagem e ação, Brosnan também deixou sua marca em romances leves. Em Uma Loira em Minha Vida (1997), dividiu a cena com Julianne Moore em uma história de encontros e desencontros de advogados que acabam se apaixonando. Mais tarde, em Lembranças (2010), apareceu como pai de Robert Pattinson em uma trama centrada em relações familiares e perdas, provando que conseguia oscilar entre humor, drama e sedução.
George Clooney: do plantão médico ao retorno às comédias românticas
O impulso inicial

Antes da fama em Hollywood, George Clooney já era presença constante na TV norte-americana. Seu papel como Dr. Doug Ross em Plantão Médico (ER) o transformou em símbolo de charme nos anos 90. A mistura entre dedicação profissional e vida pessoal tumultuada fez dele um dos personagens mais comentados da década na televisão, abrindo portas para o cinema.
Primeiros romances no cinema
Em Um Dia Especial (1996), ao lado de Michelle Pfeiffer, Clooney interpretou um jornalista divorciado que, em meio à correria da rotina, descobre espaço para uma relação afetiva. O filme mostrou que, além do rosto associado ao drama médico da TV, havia ali um ator divertido e empático.
A busca por outros gêneros
Ainda nos anos 90, Clooney arriscou caminhos diferentes. Um Drink no Inferno (1996), dirigido por Robert Rodriguez, foi um mergulho no terror pulp, contrastando com sua imagem de galã televisivo. Em 1997, assumiu Bruce Wayne em Batman & Robin, título mal recebido pela crítica, mas que reforçou sua capacidade de segurar franquias.
O salto definitivo
Nos anos 2000, Clooney consolidou sua imagem no cinema. Com Onze Homens e um Segredo (2001) e suas sequências, ganhou notoriedade global, unindo humor, crime e carisma. Mais importante, decidiu expandir sua atuação também para trás das câmeras. Confissões de uma Mente Perigosa (2002), sua estreia na direção, revelou interesse em histórias de fundo político e questionamento moral, afastando-o do rótulo de ator limitado ao romance.
Logo depois, dirigiu Boa Noite e Boa Sorte (2005), drama em preto e branco sobre jornalismo nos anos 50, que recebeu seis indicações ao Oscar, incluindo Melhor Filme. Reforçando a imagem de Clooney como artista que queria participar ativamente do debate cultural, não apenas aparecer em cartazes.
Retorno ao romance
Depois de anos dedicados a dramas e projetos autorais, Clooney voltou à comédia romântica em Ingresso para o Paraíso (2022), contracenando com Julia Roberts. Os dois interpretam pais divorciados que viajam para impedir o casamento da filha. O longa, filmado na Austrália durante a pandemia, arrecadou mais de US$ 170 milhões. Fez com que o filme se tornasse um dos maiores sucessos do gênero na década.
O presente
Hoje, Clooney divide seu tempo entre produções de grande alcance e filmes autorais. Pode aparecer em um romance e, no ano seguinte, dirigir um drama político sobre desigualdade ou corrupção. Essa alternância o mantém relevante para públicos de diferentes idades e reforça seu status como figura versátil.
O legado
Clooney é exemplo entre os galãs da década de 90. Enquanto Grant abraçou papéis satíricos e Gere buscou dramas de prestígio, Clooney construiu carreira paralela como diretor. Seu retorno ao romance em Ingresso para o Paraíso não soou como nostalgia, mas como atualização — prova de que o gênero ainda pode dialogar com histórias de adultos em fases posteriores da vida.
Homens maduros ou adolescentes carismáticos
No fim das contas, tudo se conecta. Hugh Grant, Richard Gere, Pierce Brosnan e George Clooney ajudaram a ideia de romance no cinema dos anos 90.
Depois, vieram os galãs teens, que assumiram funções semelhantes em histórias de outra época, já permeadas por redes sociais, mudanças de comportamento e novos códigos de sedução. É a mesma linhagem: homens que, de formas distintas, continuaram a encantar plateias em romances.
Sejam os galãs teens ou os homens irresistíveis que atravessaram os anos 90, todos fazem parte de uma mesma conversa. E talvez seja justamente isso que mantenha viva a atração do gênero: a possibilidade de ver o amor ganhar corpo em telas grandes ou pequenas, com rostos que cada geração adota como seus.
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