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Crítica: ‘A Voz de Hind Rajab’: documentos para despertar a empatia

O que você verá aqui:

Em seu ensaio fundamental Diante da Dor dos Outros (Regarding the Pain of Others, Estados Unidos, 2003), a propósito de documentos como a fotografia de guerra, Susan Sontag questiona até que ponto é válida—e para quais fins—a representação da violência e do sofrimento alheios. Questão sumamente pertinente ao assistir A Voz de Hind Rajab (Tunísia e França, 2025), docudrama da diretora Kaouther Ben Hania que recebeu o Grande Prêmio do Júri no Festival de Veneza, e que faz parte da seleção oficial do Festival do Rio em 2025.

Trata-se de uma produção que, dada sua natureza, desperta questionamentos éticos sobre a utilização de seu material e seu propósito, a representação que faz de uma circunstância real, e a urgência inescapável da mesma.

Do que se trata A Voz de Hind Rajab: é uma história real?

A Voz de Hind Rajab é um filme que mistura elementos de documentário com drama para recriar os acontecimentos de 29 de janeiro de 2024 na Faixa de Gaza. Durante a invasão das Forças de Defesa de Israel (IDF) à cidade de Gaza, uma menina palestina de cinco anos, Hind Rajab, tentou evacuar junto com sua família. Durante um ataque israelense, morreram seus tios e três primos com os quais viajava. A única outra sobrevivente, sua prima adolescente Layan Hamadeh, conseguiu contatar o Crescente Vermelho Palestino para pedir assistência antes de ser assassinada.

Voluntários do Crescente Vermelho Palestino receberam a chamada telefônica alertando que a menina de cinco anos estava presa em um carro sob ataque das forças da IDF. O filme se desenvolve totalmente a partir da perspectiva dos voluntários, que tentaram superar a burocracia dos sistemas de ajuda humanitária para fazer chegar uma ambulância. A situação é dramatizada por atores profissionais, mas utilizando os registros telefônicos reais da chamada para incluir os verdadeiros pedidos de socorro de Hind Rajab no filme, assim como algumas fotos suas.

Crítica: 'A Voz de Hind Rajab': documentos para despertar a empatia
Os voluntários do Crescente Vermelho Palestino tentaram manter Hind Rajab ao telefone durante horas (Crédito: Synapse Distribution)

Como (e por que) A Voz de Hind Rajab desfoca a fronteira entre representação e realidade

Não é um spoiler—e a verdade, seria insultantemente banal tratá-lo como tal—dizer como terminou esta história. A pequena Hind Rajab foi assassinada por um ataque israelense, assim como os dois voluntários que iam em seu auxílio em uma ambulância. É uma situação que esteve em noticiários e jornais, provocando indignação em nível mundial.

Qual é, então, o propósito de fazer um filme como este, especialmente quando se traz à frente material auditivo—as gravações telefônicas—de uma vítima tão recente, caminhando na linha tênue entre o testemunho documental e a exploração sensacionalista?

Cabe partir de dois pontos. O primeiro: a mão da cineasta tunisiana Kaouther Ben Hania para desfocar a barreira entre a realidade e sua representação cinematográfica, levando em conta que nem mesmo o documentário é uma representação total e objetiva de dita realidade, mas que também tem subjetividades emocionais, políticas e éticas.

Em As 4 Filhas de Olfa (Les Filles d’Olfa, França, Alemanha, Tunísia e Arábia Saudita, 2023), por exemplo, a diretora conta a história de Olfa, uma mulher que perdeu suas duas filhas mais velhas ao se radicalizarem e se unirem às forças do Dáesh. A abordagem de Ben Hania é unir em cena a mãe e as duas filhas restantes com atrizes profissionais no papel das duas desaparecidas para recriar memórias, situações, e proporcionar uma aproximação a suas histórias que permite uma catarse, proximidade e humanidade, sem perder o respeito pelas feridas abertas de suas protagonistas.

A Voz de Hind Rajab
O filme resgata a gravação da última chamada telefônica de Hind Rajab, assim como fotografias verdadeiras suas (Crédito: Synapse Distribution)

O caso de A Voz de Hind Rajab pode ser considerado distinto, pois o uso das gravações da menina roça perigosamente com o sensacionalismo. No entanto, o segundo ponto que devemos considerar é outro argumento de Sontag, que questiona quando ou se realmente vale a pena exumar as memórias—sonoras, neste caso—das vítimas da guerra e da violência. A ensaísta propõe que talvez seja fútil, pois a distância do tempo tende a inocentar os perpetradores. Mas o que acontece quando essa distância ainda é suficientemente pequena para permitir que o braço da justiça os alcance?

Ben Hania nos lembra sobre essa imediatez, primeiro, ao narrar o acontecimento a partir da perspectiva dos voluntários do Crescente Vermelho Palestino, cuja urgência por salvar a menina contrasta com o outro grande propósito do longa-metragem: expor a inoperância burocrática dos sistemas de ajuda humanitária internacionais. A diretora nos situa desde o começo na data, da qual mal passou um ano.

Em momentos-chave, sua câmera não só registra as dramatizações, mas também telas de celulares com vídeos dos momentos reais, tal qual aconteceram no centro de atendimento telefônico. A câmera de cinema direciona nossa atenção para as câmeras de bolso, mais versáteis e imediatas que qualquer jornalista ou historiador, mas igualmente impotentes para mudar as coisas.

A Voz de Hind Rajab
A diretora Kaouther Ben Hania não busca sensacionalismo, mas sim exaltar a urgência de uma situação em curso (Crédito: Synapse Distribution)

Utilizar atores profissionais para recriar os fatos não pretende explorar a tragédia em nome da indulgência dramática, mas sim enquadrá-la e exaltá-la. Sontag argumenta finalmente que os documentos da crueldade têm pouco poder para mudar as coisas, mas uma visão otimista deve nos lembrar que há poder. Pouco, mas há.

O ato de resgatar as gravações da pequena pode existir em uma zona moralmente cinzenta e incômoda. Ao mesmo tempo, as converte em um testemunho devastador e inquestionável do custo cruel de nossa apatia, inação e burocracia coletiva, diante de uma máquina cultural e política que esconderia de bom grado a verdade debaixo do tapete. Que se incomodem eles. E que no resto, pelo menos, siga viva a empatia.

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